1- Estava parado num semáforo, à espera que o verde aparecesse (num semáforo que outra coisa podemos esperar?) quando ouvi uma travagem violenta, daquelas que “chiam” por todos os lados, e disse para os meus botões “cheira-me que alguém vai levar uma porrada”. Os botões nem tiveram tempo de responder, pois quem levou a porrada foi o meu carro, ficou com a traseira toda “metida dentro”.
Saí do carro e encarei o “adversário”, que era um motorista de táxi. A cena passa-se num fim de tarde, eu olhei para a cara dele e perguntei: “então que aconteceu?” como se não estivesse à vista o acontecido.
O homem então respondeu-me assim: “vamos já tratar dos papéis para o seguro, chiça que já é a 3ª vez hoje que isto me acontece”.
“É pá, você é um perigo público, ou está feito com as oficinas de reparação?”
Rimo-nos e na despedida eu desejei-lhe que não acabasse o dia sem mais dois ou três acidentes, para ir para o Guiness.
2- Estava com uma gripe tremenda, já com febre elevada e ia almoçar para poder tomar uns comprimidos e deitar-me. De repente o carro que seguia à minha frente e que era um táxi, parou bruscamente e apesar da minha travagem rápida, o meu carro embateu na traseira do outro. Pancada pequena ao nível do fecho da mala, o que a fez abrir-se e provocou uma ligeira amolgadela. O motorista saiu do táxi, olhou para a amolgadela e a chorar disse: “ um carro novinho em folha, estreei-o hoje e acontece uma coisa destas!”.
Sem grande vontade para brincadeiras ainda lhe respondi: “teve sorte, foi uma pancada pequena, ficou já batizado. Vamos tratar dos papéis que eu estou muito doente”.
E o homem ainda com a lágrima ao canto do olho…
3- Havia em Lisboa um célebre polícia sinaleiro, muito entrevistado e fotografado por turistas, que parecia um bailarino em cima do seu “pedestal”. Prestava serviço, em geral na zona do Saldanha/Avª Fontes Pereira de Melo.
Num belo fim de tarde de primavera, ia eu de carro da Avenida da República para a zona do Marquês e parei no Saldanha para comprar um jornal. Meti-me de novo no carro, desci a Av. Fontes Pereira de Melo e lá para o meio deparei com o tal guarda sinaleiro (se a memória não me atraiçoa chamava-se Inácio) que me mandou parar, pois o trânsito estava aberto no outro sentido. Aproveitei a pausa para agarrar no jornal e ler a 1ª página. De tal modo me distraí que durante um espaço de tempo não sei o que aconteceu. Posteriormente, ao analisar o caso, eu devo ter dado conta de que o trânsito foi aberto, pois quando “voltei a mim” estava a entrar na rotunda do Marquês de Pombal. Percorri aqueles trezentos metros sem dar conta de nada, sempre a ler o jornal. Ainda hoje não tenho uma boa explicação para o caso. Felizmente não entrei na rotunda porque um carro parado na via em que eu seguia me “parou”. O trânsito nessa altura também era comandado por sinaleiros e um deles estava mesmo em frente do carro com quem choquei. Foi um choque espetacular, nem tive tempo de travar, pois continuava a ler o jornal. Aquele carro, foi a minha salvação, pois se tenho entrado na rotunda, teria atropelado violentamente o polícia, embatido em meia dúzia de carros que circulavam na rotunda (hora de ponta) e muito provavelmente até o próprio Marquês de Pombal não teria escapado e teria vindo de trombas ao chão.
Tive, tivemos todos, muita sorte. Mas só eu me apercebi disso, ninguém soube do motivo daquele acidente. O próprio sinaleiro nem sonhou o que lhe poderia ter acontecido, de tal maneira que nos mandou (a mim e ao carro que me “parou”) sair dali e tratar do assunto numa das circulares exteriores, no caso, junto ao Parque Eduardo VII. O carro acidentado era dum funcionário do consulado de Israel em Lisboa, que se lastimou, pois estava de volta a Israel dentro de dias e precisava de levar o carro e me disse que eu vinha com excesso de velocidade (ele também não se apercebeu da “história” do jornal). Estávamos para começar a tratar da papelada para a participação do acidente, quando chegou perto de mim um rapaz dos seus 18/19 anos, muito afogueado e preocupado e que me disse assim: “ o senhor desculpe-me, eu é que tive culpa do acidente”. Olhei-o espantado, respondi que a culpa era toda minha, mas ele insistiu: “não, não, a culpa foi minha. Eu vi que o senhor vinha a ler o jornal, apercebi-me que se ia dar um acidente, estive para saltar para o meio da rua e gritar para lhe chamar a atenção, mas tive vergonha e não fiz nada. Desculpe-me por favor, eu sou o culpado”.
Lá tive de o convencer que não tinha culpa nenhuma, que era toda minha e que não pensasse mais no assunto. Pedindo-me desculpa mais uma vez, lá se foi embora enquanto eu e o israelita tratávamos da papelada.
Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.