Há umas dezenas de anos atrás, um amigo meu ia a passar no Largo do Carmo, em Lisboa e resolveu sentar-se a descansar à sombra, num dos bancos que então havia no Largo (não sei se ainda hoje existem ou não).
Mal se tinha sentado, a sentinela do Quartel do Carmo (da GNR) chamou-lhe a atenção dizendo que era proibido sentar-se naqueles bancos. O meu amigo achou estranho e perguntou a razão da proibição. A sentinela disse que não sabia, mas que havia ordens para não deixar sentar ninguém.
Como aquilo não fazia sentido, pediu para falar com o “Oficial de dia” que apareceu passado pouco tempo. O meu amigo explicou-lhe a razão daquela sua chamada.
O “Oficial de dia”não sabia daquela ordem, perguntou à sentinela a razão da proibição. A resposta foi igual, não sabia, mas com um pormenor: aquela proibição estava na “ordem do dia”. O oficial foi ver a “ordem do dia” e lá estava o assunto. A razão? Não sabia. Foi ver a “ordem do dia” anterior e lá estava também a proibição. Perguntou a um e a outro, ninguém sabia quem tinha dado a ordem e quando, pois chegaram à conclusão de que o “caso” já vinha muito lá de trás. As ordens do dia era copiadas da do dia anterior e raramente tinham alguma coisa de novo. Limitavam-se a transcrever o que devia ser feito pelos diversos “atores” do Quartel. De investigação em investigação o caso foi levado até ao Comandante do quartel que também não sabia nada sobre o assunto. Depois de muita conversa, de muitas interrogações, de muita pesquisa, alguém se lembrou dum episódio passado há uns meses (ou anos?) atrás e que explicava a proibição e o facto de ser a sentinelas de serviço na portaria a zelar por aquela ordem de ninguém se poder sentar nos bancos do Largo do Carmo.
Acontecera que um dia a Câmara pintara os bancos e pedira no quartel para que a sentinela não deixasse ninguém sentar-se durante um ou dois dias enquanto a tinta estivesse fresca. Medida cautelar para não estragar a roupinha aos cidadãos mais distraídos. Nesse dia essa obrigação da sentinela saiu na “Ordem do dia” e como se está mesmo a ver, foi sucessivamente copiada ao longo de meses (ou anos?).
O meu amigo fartou-se de rir com o assunto, os próprios oficiais também acharam muita piada ao caso e isto só prova como as coisas podem acontecer na vida duma instituição e na vida duma pessoa. A rotina, a falta de atenção dedicada aos assuntos, numa palavra, a falta de profissionalismo
conduz quase sempre a estas situações. Também aqui, como contei no post anterior, o assunto devia ter sido arquivado no dossier dos casos curiosos.
Mas por cá não há esse sentido de humor…
Um dia eu andava a passear com o meu amigo na baixa, subimos o Chiado, a conversar ele disse-me que me ia mostrar uma coisa e levou-me até ao Largo do Carmo. Sentamo-nos num dos bancos e então ele contou-me a história que aqui deixo registada.
Para que conste.
Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.