O Peru (fotografado durante a conversa)
- Olá amigo Peru!
- Glu, glu, Caraglu!
- Como?
- Desculpa Carapau, não tinha ligado o Glooglugler para a tradução simultânea.
- Julguei que te tivesses passado…
- Nada disso. Foi só um esquecimento. E tu como vais Carapau?
- Estou bem obrigado. Tu é que pareces estar com um ar muito emproado!
- Emperuado, queres tu dizer…
- Ou isso. Mas olha que não te fica nada bem, nesta época…
- Qual época?
- Natal à porta, tens de ter cuidado.
- Ah! O Natal! Claro é uma época muito má para a peruada. É cada razia…
- E isso não te preocupa?
- Não sei por quê. Ainda há dias lá pelos States, no Dia de Acção de Graças, foi um aviar neles, bastante superior à pandemia que vai alastrar por aqui.
- E tu ficas assim descontraído?
- Claro! Que queres que eu faça? Não é para isso que os perus são criados?
- E tu?
- Comigo é um pouco diferente. Ainda não é este ano que me depenam…
- Estás assim tão certo?
- Claro que sim. Ainda ontem ouvi os tipos lá no aviário a dizerem que eu ainda estou em plena forma. O encarregado disse mesmo: “Este sacana do Perualho (é o meu nome) está cada vez melhor. Avia aí a clientela toda e mais aviaria, se houvesse”.
- Clientela? Não entendo. Então tu também…
- Calma Carapau. Essa de “aviar a clientela” é uma maneira lá deles falarem. Queria o tipo dizer que ainda arrasto bem a asa e salto para o lombo das peruas, com classe.
- Com classe?
- Claro. O que tem de ser feito tem de ser bem feito e com classe.
- E são muitas as peruas?
- Umas largas dezenas. Tudo material escolhido a dedo. Poedeiras de primeira água…
- Por falares em água, diz-me uma coisa. Essa história de os perus se embebedarem com aguardente é verdade?
- Parece que sim. Acontece que os presumíveis bêbados desaparecem e não podem confirmar isso.
- Quer dizer: apanham cada perua…
- Isso de apanhar as peruas é só comigo. E há umas bem jeitosas.
- E então tu és o único a …como se diz? Ah! Sim, a “aviar a clientela”?
- Lá em casa sou o único. Por isso é que estou a salvo neste Natal. Um Natal virá…
- “Há-de vir um Natal e será o primeiro…”
- No meu caso será o último…
- Lá proa e prosápia tens tu! Fazes andar as peruas com a cabeça à roda, não?
- Em geral quem anda à roda, a arrastar a asa, sou eu.
- Como os galos?
- Não confundas, por favor. Galo é galo, peru é peru.
- Pois, com certeza. Foi só maneira de dizer… mas se os galos galam, o que fazem os perus?
- Os galos galam as galinhas, nós fazemos o mesmo às peruas.
- Galam também?
- Sei lá se galam se não galam. Sei que arrasto a asa, namoro-as, espero que se ponham em posição e depois faço o meu serviço.
- Serviço?
- É o que dizem lá no aviário. Que eu ainda faço bem o serviço.
- Bem…isso tu lá sabes. Também tens um monco que te deve ajudar um bocado…
- O monco não faz o peru…
- Mas ajuda…
- Isso é verdade. Em geral as peruas ficam logo receptivas quando eu apareço.
- Se tu o dizes … Espero ver-te por cá mais vezes.
- Não tenho muito tempo livre.
- Sabes uma coisa? Anda por aí um monte de pessoas que parecem mesmo uns perus.
- Isso sempre houve. Umas vezes mais, outras vezes menos. Vocês podiam era aproveitá-los para um churrasco agora no Natal.
- Peru de churrasco? Tem carne muito seca.
- Esses perus em geral até são rechonchudos, saia-lhes aquela gordura toda, olha que iam ficar um pitéu.
- E por onde se lhes metia o espeto?
- Olha, olha! Pelo sítio do costume. Qual o problema?
- Não sei não…
- Vai por mim…mas agora quem se vai embora sou eu que tenho umas peruas à minha espera.
- Só mais uma coisa Peru amigo. Li há dias que também és um responsável pela emissão de CO2. Tu e os teus, as vacas, os carneiros e o resto dessa maltósia. Que dizes a isto?
- Não sei nada disso, não conheço esse tal CO2, cheira-me a gás…
- É isso mesmo, um gás…
- Tenho digestões fáceis, engulo muita pedra, tenho pouca flatulência, não vejo onde esteja o problema, no que diz respeito aos perus. Ou talvez saiba, pensando melhor…
- Ai sim? Conta lá isso à gente!
- Creio que essa treta é só para justificar a razia que vamos sofrer brevemente. Mas já estamos habituados, mais acusações menos acusações, cá vamos grugrulejando à nossa maneira.
- Então bom grugrulejo amigo Peru e até outro Natal.
- Até lá, Carapau!