Quinta-feira, 28 de Março de 2013

Feira da Ladra

Ando há anos para ir à Feira da Ladra, mas por isto ou por aquilo, sendo que “isto” a ver com um certo comodismo, o tempo tem passado e eu sem ir.

É certo que nada de especial me leva lá a não ser a curiosidade de a comparar com o que a feira era há uns anos atrás. Não pretendo comprar nenhuma “pechincha”, aliás dou-me mal com este tipo de compras e também não pretendo vender nada (meu peixe vendo-o aqui).

Outrora o que me levava lá era ver e ouvir os vendedores de banha de cobra. Bons tempos em que honestos vendedores nos vendiam produtos que curavam tudo (“ dois limpam o sangue, cinco curam o “câncaro…”).

Hoje vendem-nos gato por lebre, os vendedores perderam a vergonha e os compradores não são melhores.

Hoje, em que milhares de petições correm na net para isto e para aquilo, pró e contra, a insultar e a elogiar, pergunto-me se eu não deveria também lançar uma petição para aparecerem nas televisões aqueles meu “velhos amigos” da banha de cobra (quando era jaquinzinho cheguei a colaborar acidentalmente com um deles que me “obrigou” a segurar uma caixa onde estaria o “bicho” com que chamava a atenção das pessoas, embora a caixa estivesse vazia, coisa que só ele e eu sabíamos).

Substituir todos os atuais “vendedores” (entre aspas porque são fracos profissionais) de políticas e futebóis, que enjoam, enojam e me dão volta ao delicado estômago, por autênticos vendedores de banha de cobra, devia ser um projeto nacional.

“ Não estou aqui para enganar ninguém” era uma frase batida por esses homens de linguarejar simples, mas franco e aberto (“e aquele senhor que está ali a abanar a cabeça é a prova do que eu digo, veio cá hoje para levar mais umas embalagens”).

Hoje não há quem tenha coragem para dizer que não está para enganar ninguém, quando anda meio mundo a enganar o outro meio (que, permitam-me a franqueza, está mesmo a pedir para ser enganado).

Um dia no Porto (e já me estou a afastar da Feira da Ladra umas centenas de quilómetros) estive a ouvir um desses magos que vendem milagres e que se dirigia à assistência com uma linguagem mais elaborada e que chamava às pílulas de quinino de “anjos brancos e puros que têm salvado inúmeras vidas”. Isto para as comparar com o produto que vendia (“eu não venho aqui para vender nada, cada embalagem na farmácia custa 10, aqui não custa nem 10, nem 7, nem 5. Apenas por 4 moedas podem levar para casa não uma mas 3 embalagens”).

Desapareceram estes “homens bons” que eram a base do serviço nacional de saúde de então e apareceram os outros para nos tratar da saúde…

Dos outros eu era assíduo ouvinte e espectador, destes “passem bem” que tenho mais que fazer. Com uma agravante: é que mesmo sem os “consumir” tenho de lhes pagar.

 

Dizem-me que na Feira da Ladra já não há vendedores de banha de cobra…

 

BOA PÁSCOA!

 

PS: Li, há dois ou três dias, que a imprensa espanhola publicou com espanto a notícia da contratação de Sócrates (o “filósofo português, não o grego) para comentador duma televisão em Portugal. “Com espanto”, pois era absolutamente impensável que um ex-primeiro ministro espanhol pudesse passar a ser comentador político.

Pois!

Mas Espanha e espanhóis, por muito que lhes chamemos “nuestros hermanos” são outra realidade, onde ainda há um sentido de honra e dignidade que nunca houve cá desta banda da fronteira.

Depois…não têm uma Feira da Ladra como nós temos…

 

Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.        

publicado por Carapaucarapau às 14:31
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Quinta-feira, 21 de Março de 2013

Vida em comum

 Ela ali estava à minha frente com aquele ar branco e puro com que sempre a conheci. Olhávamo-nos como se fosse a primeira vez, embora eu sem a interrogação ansiosa com que durante muitos anos a encarei. Às vezes mais calmo, outras mais nervoso, mas sempre com uma ponta de interesse, a interrogar-me “como vai ser desta vez”?

Hoje já a fito com muito mais serenidade, desconfio que ela também já saiba que acabarei por lhe dizer alguma coisa, ainda que, qual melão por abrir, nunca saibamos à partida como a conversa se irá desenrolar.

Quando a encarei pela primeira vez na minha vida, pareceu-me ver nela um sorriso trocista, embora muito disfarçado, como quem está a pensar “vamos a ver como este me vai tratar e o que me vai dizer”.

Eu, com todo o cuidado para a não magoar, a primeira vez é quase sempre complicada, embora reconheça hoje, fruto da ignorância juvenil e duma certa inconsciência me tenha atirado a ela como gato a bofe, ainda que a imagem não seja nada apropriada ao momento.

Se bem me lembro, correu tudo bem, sem traumas para ambas as partes.

Curiosamente a vida em comum nem sempre melhorou com a idade e com os conhecimentos que, por muito poucos que sejam, se vão adquirindo num relacionamento que se vai prolongando pela vida fora. Estabelece-se um modus vivendi de rotina, quantas vezes fiz dela gato-sapato (e é a segunda vez que o gato aparece nesta confissão, vá-se lá saber a razão), outras vezes tratei-a nas palminhas, quando tudo corria bem entre nós.

Suponho, reparo agora que nunca falamos nisto, que pela maneira como lhe pego e a afago, ela já sabe o meu estado de espírito e sente primeiro que eu que tudo vai ser fácil e correr bem.

Interrogo-me muitas vezes, quando me dá gozo estar com ela e tudo corre bem, se ela também se diverte ou não. Ainda que quando lhe aparece uma ligeira ruga em certa zona, eu fique com a sensação que gostou e que me está a desfrutar. Nunca falamos nisto, quando tal ocorre.

Hoje foi um desses dias em que não falamos um para o outro. Ela impávida e serena, eu meio expectante (a pressa não ajuda nada nestes casos) sem saber como me ia sair.

Pergunto-me quantas vezes não estivemos assim, frente a frente, sem saber o que dizer, sem um gesto, eu a pensar em tantas coisas e nem sempre as apropriadas e ela, muda, parada, à espera.

Muitas vezes, tenho quase a certeza, ela nem se apercebeu que eu já tinha realizado os meus intentos e ela ainda se julgava “in albis”.

Como talvez desta vez, em que publicamente a exponho, em que já fiz tudo o que me propus e ela ali, a olhar para mim, à espera que eu me decida.

Só que hoje utilizei o Word para escrever diretamente este post, enquanto ela, a folha de papel branco, continua à espera que me atire a ela.
Ocasiões não lhe hão de faltar.

 

 Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.        

publicado por Carapaucarapau às 14:49
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Quinta-feira, 14 de Março de 2013

Papa pastilhas

 Enquanto fazia ontem a minha marcha diária, a pensar que teria de publicar hoje um post (mais para manter a “tradição” do que por qualquer motivo outro), tentei arranjar um assunto. Apesar de ter espremido a caixa dos

“pensamentos”, a verdade é que nem um pingo dela se soltou. Uma, duas, três tentativas e cada vez mais seca e mais árida. Disse um palavrão para ver se ela (a caixa) se acagaçava, mas nada. Não sei se sou homem de fé (de café sei que não sou) se teimoso (sei exatamente o que sou, mas convém expressar-me assim, ou não estivesse a decorrer o conclave cardinalício para escolherem o Papa que há de andar no Papamóbile, pois tal como a “dama é móbil” o Papa também…)

Na falta de fumo branco e não sendo eu fumador, não me meti no assunto e voltei à minha questão: “Carapau amanhã é dia de post”.

Foi nesse preciso momento que me cruzei com uma mulher que fazia três coisas ao mesmo tempo (que eu visse, porque ocultamente podia ainda fazer outras…). E essas coisas eram: andar, falar ao telemóvel e mastigar uma pastilha elástica. E fica provado mais uma vez, se é que havia necessidade disso, que as mulheres conseguem fazer várias coisas ao mesmo tempo, o que não é para todo o mortal.

Vamos ao que interessa agora: à pastilha elástica.

Não sou adepto nem praticante, o que não quer dizer que uma vez lá quando o rei fazia anos eu não mastigasse (diria mesmo que no tempo da monarquia). Não vejo nenhuma vantagem nisso, a não ser em casos especiais, em que a ocasião faz o ladrão, e este (ou esta) tenha comido ao almoço uma quantidade razoável de alhos crus, para afugentar o mau olhado, e entretanto convém fazer uma limpeza rápida e a seco da cavidade bocal para ficar minimamente apta…

A mulher em questão não mastigava discretamente, abria e fechava a boca como se de uma trituradora se tratasse. Espetáculo lindo de não se ver.

Resolvi então fazer um levantamento do “assunto pastilha elástica”. Quase só mulheres a mascam, a maioria, a grande maioria, no ritmo “abre e fecha a boca à velocidade da luz”, atacam a pastilha como se ela fosse a causa de todos os males da humanidade.

Não podia deixar de me lembrar de uma frase célebre de Bernard Shaw (1856-1950), pelo menos é-lhe atribuída e vai bem para o seu humor satírico e irreverente: “ a diferença entre uma mulher americana a mascar chiclets e uma vaca a ruminar, está no olhar inteligente da vaca”.

 Naquele tempo ele só se referiu às americanas, porque eram as únicas que já mascavam pastilhas. Hoje estenderia o dito a todas as nacionalidades (não a todas as mulheres) e eu poderia ser testemunha disso.

Verdade é que eu nunca vi uma vaca a ruminar de boca aberta…

 

Entretanto e enquanto escrevia este post, saiu fumo branco pela chaminé da Capela Sixtina e, pelos menos as pessoas que estavam ansiosas ou nervosas pela falta de Papa, já podem acalmar e deixar de “ruminar” as pastilhas elásticas.

Preparem-se antes para dançar o tango…

E termino com uma pergunta: será que agora o carro do Papa se vai passar a chamar Pampasmóbile?

 

Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.        

publicado por Carapaucarapau às 18:52
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Quinta-feira, 7 de Março de 2013

Entrevista

- Boa tarde. João Esteves de Carvalho.

- Boa tarde. Alfredo Madeira de Pinho.

- Parece que ainda somos aparentados.

- Não tenho conhecimento disso.

- Pelos apelidos…

- Não temos o mesmo.

- Pois não, mas…não tem importância. Sente-se por favor. Então o que o trouxe cá?

- O meu irmão.

- Que tem o seu irmão a ver connosco?

- Comigo tem a ver, é meu irmão; com o senhor creio que não tem nada a ver, nem nunca ouviu falar.

- Mas então porque disse que foi o seu irmão que o trouxe cá?

- Exatamente porque foi ele. Está lá fora no carro, à espera que eu saia da entrevista.

- Ah! Entendi. Mas não foi isso que eu perguntei. Perguntei-lhe qual o motivo da sua vinda aqui?

- Respondi ao anúncio, os senhores marcaram-me esta entrevista e apresentei-me.

- Sim, tudo bem. Faço a pergunta de outra maneira: que razão ou razões o levaram a responder ao nosso anúncio? Conhece a nossa empresa? Já trabalhou neste setor? Gostaria de trabalhar?

- As razões foram múltiplas, a saber: estou desempregado, preciso de trabalhar, sou capaz de desempenhar qualquer lugar, estas instalações ficam relativamente perto de minha casa, tenho uma ideia do tipo de trabalho que aqui se faz e a minha namorada mora aqui perto.

- Quer dizer que mataria vários coelhos com a mesma cajadada?

- Nada disso. Não mato coelhos, nem uso cajado. O meu avô é que usava.

- De pinho?

- Sim, o meu avô era de Pinho.

- Queria eu dizer, o cajado.

- O cajado não era de pinho. O pinho não é boa madeira para cajado.

- Entendido. Fale-me da sua experiência de vida.

- Desculpe mas as boas e más experiências da minha vida não lhas vou contar.

- Como quer então que eu o avalie?

- Avaliando.

- Tem experiência na área da robótica?

- Uma luzes.

- Explique-se melhor, por favor.

- Quando era miúdo, ofereceram-me um robot todo cheio de luzes…

- O senhor veio aqui para brincar?

- Com robots? Nem pensar. O meu tempo de brincadeira já lá vai.

- Está a levar esta entrevista a sério?

- O mais sério que me é possível. É muito importante para mim ser o escolhido.

- Quanto pretende ganhar?

- O máximo que me puderem pagar, mas de acordo com o trabalho que eu fizer.

- Mas não tem um número na cabeça?

- Eu? Que saiba não. Pelo menos de manhã quando me penteei não vi número nenhum.

- O senhor acha que é engraçado?

- Não; mas a minha avó dizia muitas vezes “este miúdo é muito engraçado”. Eu não achava graça nenhuma.

- E eu também não acho graça nenhuma aos engraçadinhos.

- Um ponto em que estamos de acordo.

- Sabe que responderam muito pretendentes, ao nosso anúncio?

- Sei. Só lá fora, à espera, estão bastantes…

- Preencha esta ficha que lhe vou dar, da maneira mais concreta que for capaz, entregue-a da receção. Dentro duma semana dar-lhe-emos uma resposta. Boa tarde, senhor Pinho.

- Boa tarde senhor Carvalho.

 

O Pinho, como é conhecido no meio, é hoje um dos melhores técnicos de robótica. O Carvalho é considerado na empresa como um descobridor de talentos.

Algum tempo depois de ser admitido, estando os dois a almoçar na cantina da empresa, vieram a descobrir que a namorada do Pinho ainda era prima do Carvalho.

 

Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.        

publicado por Carapaucarapau às 14:47
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