A propósito de tudo e de nada, o jornal “Politic Now” (em linguagem de carapau “A nau da politica”) entrevistou o Carapau – o grande especialista de tudo e, sobretudo de nada.
Ao fim de uma demorada troca de correspondência para acertar os pormenores da entrevista, uma bela manhã “bateu à porta da caverna” (maneira de dizer de “Entrou por aqui adentro”) um bando de jornalistas de chapéu na cabeça com um papel a dizer “Press”, o que me chateou logo, para começar, porque não sou animal de pressas.
O bando afinal era constituído por dois belos exemplares de loiras, mas faziam tanto barulho que pareciam memo um bando. Uma trazia um biquini e um microfone, a outra trazia só uma máquina fotográfica digital, loja dos trezentos. Ficava-lhe muito bem pendurada ao pescoço. E claro, vinham as duas com chapéus na cabeça (olha que admiração!), para poderem segurar os tais papelinhos (ou estavam à espera que eu me esquecesse desse pormenor?).
PN – Mister Carapau?
CC – Não há mistério nenhum, sou mesmo o Carapau.
PN – Oh!
CC – Ah!
PN – Como sabe a nossa entrevista vai incidir sobre alguns aspectos da política contemporânea…
CC – Não sabia.
PN – Mas nas conversações preliminares…
CC – Não me lembro de já ter havido preliminares…
PN – Como sabe esta entrevista foi objecto…
CC – Foi? Como foi se ainda nem começou?
PN – … de conversações preliminares.
CC – Tenho outra concepção do que são preliminares.
PN – Como?
CC – Não lhe vou explicar isso agora aqui. Aliás eu não explico, mas posso exemplificar.
PN – Como assim?
CC – Como tudo cru. Ali com a fotógrafa eu até podia…
PN – Já lá vamos, às fotografias. Primeiro a entrevista.
CC – Tudo ao mesmo tempo seria melhor. Tipo “à molhada”.
PN – Oh, no, no… Vamos então começar.
CC – Estou preparado.
PN – Como sabe faltam poucas horas para que o Ruivo O’Escama tome posse…
CC – É verdade, quem havia de dizer que o Ruivo ia fazer uma coisa dessas…
PN – Que comentário lhe merece este acontecimento?
CC – Para já, não há acontecimento nenhum.
PN – Não há?
CC – Não. Ainda não aconteceu. Diremos que posso falar sobre o pré-acontecimento.
PN – Oh! Muito rigoroso…
CC – Sem rigor e organização não chegamos lá.
PN – Lá aonde?
CC – Ao nosso objectivo.
PN – Temos objectivos?
CC – Eu tenho, desde o princípio.
PN – Ah! Oh! Eu também…Nós também.
CC – Nós?
PN – Eu e a fotógrafa.
CC – Ah!
PN – Oh!
CC – Então?
PN – Então, pergunto eu se me der licença, que comentário lhe merece o tal pré acontecimento?
CC – Muito importante sempre o pré aquecimento.
PN – Acontecimento Mister Carapau. Acontecimento e não aquecimento.
CC – Eu estou já falar no outro assunto da entrevista: o aquecimento global.
PN – Ah!
CC – Oh!
PN – A tomada de posse vai ser quente?
CC – Tomada de posse, que se preze, é sempre quente.
PN – Oh!
CC – Está a ver?
PN – Oh!
CC – A verdade é que o Ruivo desta vez saiu da casca.
PN – Se saiu!
CC – E que tal o acha assim saído?
PN – Sorry! Aqui quem faz perguntas sou eu.
CC – E quem tira fotografias é a sua colega.
PN – E quem responde é o Carapau.
CC – Ainda bem que correspondo.
PN – Responde.
CC – Respondo.
PN – E que implicações nos vai trazer esta tomada de posse, no futuro?
CC – Se tudo for bem feito nos preliminares, não irá acontecer nada de especial.
PN – Portanto acha que o mundo…
CC – O mundo está aí para ver.
PN – E o que vai ver?
CC – Eu?
PN – Não, não. O mundo.
CC – Ah! Esse vai ver o costume. E tudo por um canudo…
PN – A célebre teoria do canudo?
CC – Essa mesma.
PN – E agora outro assunto. Que me diz do orçamento?
CC – Nem me fale nisso. Com esta quantidade de navalheiras e loiras não há orçamento que resista.
PN – E agora?
CC – Já fiz outro.
PN – E depois?
CC – Quando acabar isto faço outro.
PN – E o Carapau é capaz de fazer assim tantos?
CC – Com tempo, e desde que não seja pressionado, faço.
PN – É um orçamentista nato?
CC – Isso da NATO é outra conversa. Creio que não está nos preliminares.
PN – Oh!
CC – Ah!
PN – Posso concluir que, quanto ao Ruivo, o Carapau está convencido que vai tudo correr pelo melhor?
CC – Cá estaremos para ver.
PN – Estaremos, quem?
CC – Eu, you, a fotógrafa…não estou a ver mais ninguém.
PN – Mas não vamos ficar aqui eternamente.
CC – Pois não. Nem convém.
PN – Portanto…resta-me agradecer…
CC – Já? E aquilo?
PN – Ah! Aquilo! Vamos lá à sessão fotográfica. Ficamos muito agradecidas pela maneira como nos recebeu e pelos esclarecimentos prestados nesta entrevista e …
CC – Vamos lá então, que a fotógrafa está danadinha para dar ao gatilho.
Nota:
Quando saíram, já não nadavam muito a direito. Iam aos bordos, a fotógrafa já tinha perdido a máquina e a entrevistadora o microfone. Isto de misturar loirinhas com trabalho dá sempre nisto.
Tenho de ir fazer novo orçamento.